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Trepanation Recordings
Julho 2022

António Mota

“Eternal Recurrence” é o último trabalho de Spiralist, ou devemos dizer de Bruno Costa? O próprio afirma na contracapa da versão digipack “Spiralist is Bruno Costa and allways will be”.

Se este trabalho saiu da mente de uma só pessoa, estamos em condições de afirmar que estamos perante um músico extremamente talentoso e que não se contenta em seguir o caminho mais óbvio. E é precisamente isso que constatamos ao longo dos quatro temas que compõem este magnífico álbum.

O tema de abertura, “Sun Ra” trilha caminhos negros, pesados, bem vincados logo nas primeiras projeções vocais, onde ficamos rapidamente a perceber que Bruno tem “algumas feridas por sarar” e que não o vai ocultar ao longo dos 45 minutos de duração deste trabalho.

Apesar de conseguirmos enquadrar o som de Spiralist no espetro da música progressiva, não o conseguimos catalogar dentro de um género específico. Isto, porque logo na primeira audição de “Eternal Recurrence” damos por nós a ouvir post-metal progressivo, doom, industrial, prog rock… pincelados aqui e ali por uma infinidade de outras sonoridades, o que faz deste trabalho um álbum verdadeiramente “out-of-the box”.

Aqui não parece haver espaço para preocupações com a duração dos temas (claramente que o objetivo não passa por ter airplay nas rádios mainstream, e, ainda bem!) o que potencia nos temas uma sequência de ambientes e momentos que poderíamos apelidar de “anti-canção”. Se gostam do formato, verso-ponte-refrão, este trabalho não é (claramente) para vocês.

A produção de “Eternal Recurrence” está bastante acima da média. Não é todos os dias que um projeto nacional é misturado e masterizado na “meca” do metal: os estúdios “Fascination Street”, do aclamado Jens Bogren. Por aqui se entende logo à partida que Spiralist não pretende ser um projeto para ficar eternamente enclausurado numa garagem, mas que, pelo contrário, aspira a outros voos, o que, na nossa opinião, é perfeitamente legítimo.

Do resto do trabalho, destacamos “The unknown” um instrumental que nos transporta para o lado mais eletrónico/industrial de Spiralist. O tema funciona inicialmente como um “balão de oxigénio” que nos permite recuperar dos dois primeiros “socos no estômago” que nos foram dados por “Sun Ra” e “Transmutate”. Progressivamente o tema avança para uma verdadeira sessão de hipnose que envergonharia até os hipnoterapeutas mais experientes. Na verdade, no final do tema, temos alguma dificuldade em explicar se nos encontramos em estado de hipnose ou se estamos mesmo em transe.

E, no final, quando achamos que este trabalho não nos poderia surpreender mais, eis que Bruno retira da cartola uma das mais belas canções que ouvimos nos últimos tempos. “Eternal Recurrence”, o tema homónimo deste trabalho, é uma canção triste, melancólica, corrosiva e com um conteúdo lírico que faz de Bruno não só um excelente compositor, instrumentista e cantor, mas também um talentoso letrista. O tema termina com o verso “this is endless” e é isso mesmo que este trabalho deveria ser: infinito, pois poderíamos continuar a ouvi-lo eternamente…

Spiralist – “Eternal Recurrence”

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