Quinta do Ega (Vagos): 11 a 13 de agosto 2017
Três dias e vinte e sete bandas num cartaz heterogéneo com muitos pontos de interesse foram motivos mais do que suficientes para presenciar a segunda edição (nesta roupagem) do Vagos Metal Fest (VMF), que decorreu numa mais ampla e bem organizada Quinta do Ega. Os conimbricenses Tales For The Unspoken abriram o primeiro dia com o seu vocalista Marco Fresco a ser um verdadeiro mestre-de-cerimónias, culminando a sua actuação com a contagiante «N’Takuba Wena». E então ela chegou! Ji-In Cho e os seus And Then She Came bem tentaram manter o nível com o seu metal mais alternativo mas a voz da coreana não ajudou muito. Apesar da sua energia, a pequena vocalista não convenceu na interpretação de temas do álbum homónimo de estreia. De bem perto vieram os Revolution Within que foram responsáveis pelo primeiro wall of death do festival e por muita poeira levantada no recinto. Impressionante a maturidade em palco da banda de Santa Maria da Feira que conseguiu agarrar por completo o público com malhas como «From Madness To Sanity», «Pull The Trigger» e «Pure Hate». Depois de um thrash pleno de peso e groove chegou-nos o thrash desenfreado e a energia contagiante dos Gama Bomb. Com o sempre bem-humorado Philly Byrne ao leme – a sua fatiota amarela com desenhos de tesouras foi um sucesso – os rapazes da Irlanda do Norte não deixaram uma viva alma parada ao som de malhas como «Slam Anthem», «OCP» ou «Avenge Me!». Sem dúvida uma das melhores prestações do VMF. A reunião dos Rhapsody eram um dos momentos mais aguardados do festival. Desde os primeiros acordes de «Emerald Sword» até à última nota de «Holy Thunderforce», conseguiram por o público a cantar, com um Fabio Leone em excelente forma (bastou ouvir «Lamento Eroico») e a comunicar com o público num português brasileiro quase perfeito, fruto certamente do tempo passado com os brasileiros Angra. Apesar das teclas e coros estarem pré-gravados, foi emocionante ouvirmos e cantarmos malhas como «Wisdom of the Kings», «Land of Immortals» ou «Dawn Of Victory». O soar do novo tema «The World Is Yours» deu início a um momento de êxtase ao som dos Arch Enemy, com Alissa White-Gluz a fazer esquecer que antes estava uma Angela Gossow no seu lugar. Quem tem malhas como «War Eternal», «We Will Rise», «Dead Eyes See No Future» ou «Nemesis» e músicos deste calibre, só por muito azar ou incompetência poderiam dar um mau concerto. Vindos de Espanha e com viagem marcada para a Holanda logo após o concerto (daí terem atuado às 21:30 e não no espaço seguinte como seria normal), notou-se alguma falta de entusiasmo na actuação mas a intensidade das músicas e a presença de Alissa em palco compensaram tudo. Muitos não sabiam o que esperar dos Wintersun num evento como este pois a sua música é tudo menos festivaleira. Mesmo assim os finlandeses conseguiram agarrar o interesse do público com o tema primaveril («Awaken From The Dark Slumber») do seu novo «Forest Seasons», num alinhamento onde não faltaram momentos de todos os seus álbuns, despedindo-se do palco com «Time». Depois de uma paragem por motivos de saúde, Christofer Johnsson voltou aos palcos com os Therion. Os presentes tiveram o privilégio de assistir a uma actuação memorável com três irrepreensíveis vocalistas (Thomas e Linnéa Vikström – pai e filha – e Chiara Malvestiti) que nos emocionaram ao som de «The Rise of Sodom and Gomorrah», «Son Of The Sun», «Wine of Aluqah» e, obviamente, «To Mega Therion». A interação entre a banda e o público foi uma constante, com os três vocalistas em constante movimento e trocas de protagonismo. Na parte final o guitarrista Christofer Johnsson revelou a sua felicidade por voltar a tocar ao vivo e agradeceu ao público por fazerem esquecer a anterior má experiência durante a última passagem pelo nosso País. A noite só terminaria com o festim S&M dos Grunt que conseguiram manter o público bem desperto, não só pela presença da sua escrava em palco mas principalmente devido à qualidade e intensidade do seu death/grindgore.
Pouco mais de doze horas depois, o segundo dia do VMF iniciou-se com a mesma intensidade, com os germânicos Implore a acordarem quem ainda dormia nas tendas. Os Brutality Will Prevail trouxeram uma pitada de hardcore ao cartaz, seguidos na mesma onda, embora bem mais pesada, pelos nacionais Hills Have Eyes. O primeiro grande momento do dia estava reservado para os Metal Church que surpreenderam pela teatralidade de Mike Howe e pela reação do público a malhas como «Fake Healer», «Start the Fire», «Watch the children pray» ou «Badlands». Os olhos dos fãs estavam postos no guitarrista Kurdt Vanderhoof, único membro restante da formação original, mas todos os veteranos músicos em palco puderam demonstrar que o grupo mantém uma vitalidade de invejar. Numa noite que se previa de diversos tipos de celebração, os Primordial cumpriram bem o seu papel, com Alan Nemtheanga e restante trupe irlandesa a conseguir cativar o público com momentos como «Where Greater Men Have Fallen», «Rome Burns» ou «Wield Lightning to Split the Sun». Durante sessenta minutos o vocalista foi o ponto central graças não apenas ao seu aspeto visual mas principalmente à forma empática como interagia com o público. O espírito quase religioso dos Primordial contrastou com a alegria que se seguiu, com os Korpiklaani a mostrarem que sem eles a festa não seria a mesma. As contagiantes «A Man With A Plan», «Rauta» e as inevitáveis «Wooden Pint», «Vodka» e «Beer, Beer» criaram um salutar rebuliço na plateia. Uma verdadeira festa popular em versão folk metal onde não faltou, imagine-se, um “comboinho” entre o público e o mosh… A maior assistência do festival estava reservada para os Soulfly ou não estivéssemos perante a verdadeira lenda que é Max Cavalera. No meio da alucinante sessão de mosh e crowdsurfing poucos deram importância ao facto do brasileiro mal tocar na sua guitarra, estar vocalmente em baixo de forma ou ter arrastado por vezes penosamente o alinhamento. Abrindo com «Blood Fire War Hate», pudemos ainda escutar malhas como «We Sold Our Souls to Metal», «Prophecy» ou «Seek ‘n’ Strike». Para o final ficou uma atabalhoada «Umbabarauma», a muito celebrada «Refuse/Resist» dos Sepultura e a habitual coreografia saltitona em «Jumpdafuckup», complementada com «Eye for an Eye» e uma breve incursão por «The Trooper» dos Iron Maiden. Valeu a Max um Marc Rizzo a segurar as pontas na guitarra e a soberba demonstração de bateria do seu filho Zyon. Uma das melhores atuações do VMF foram os Powerwolf que surpreenderam com uma coleção dos seus melhores temas e surpreenderam-se com a fantástica reação do público. Inicialmente abençoados com «Blessed & Possessed», tivemos depois um «Coleus Sanctus», dedicado aos homens presentes no recinto, e a as cabeças a abanar em «Amen And Attack». Com o bem-humorado Attila Dorn secundado pelo teclista Falk Maria Schlegel, os Powerwolf integraram vocalmente o público na «Armada Strigoi» e mostraram a sua versão da Páscoa com «Ressurrection By Erection». Até ao final destaque para «Werewolves of Armenia» e «We Drink Your Blood» num concerto memorável. Após uma longa espera de uma hora, numa noite que já se tornava fria e húmida, os polacos Batushka apresentaram-nos de forma convincente a sua liturgia composta pelas oito Yekteniya. Oito entidades em palco, todas vestidas da mesma forma, num espetáculo que foi tão visual quanto auditivo.
O pouco público presente no início da atuação dos thrashers espanhóis Reaktion comprovava o cansaço das jornadas anteriores. De seguida os Attick Demons com a força do seu heavy metal mais tradicional trouxe-nos uma infelizmente curta demonstração do seu repertório, onde se destacaram «City Of The Golden Gates», «Let’s Raise Hell» e «Atlantis». A intensidade vocal de Artur Almeida e o sorriso contagiante de Luís Figueira foram bem evidentes numa atuação muito bem recebida pelo público. Os Miss Lava com a sua boa onda e irrepreensível demonstração da sua qualidade comprovaram que estamos muito bem servidos de bandas em Portugal. O seu stoner rock foi bem representado por malhas como «In the Arms of the Freaks», «Black Unicorn» e «Ride», com Johnny Lee a mostrar-se satisfeito com a reação positiva do público, oposta aquilo que lhe tinham dito que poderia acontecer. O dia de hoje era também para o público mais jovem adepto do metalcore, com uns Chelsea Grin a fazer alguns jurar que estava o Agir em palco e os Whitechapel com uma demonstração de peso, alguma indiferença pelo público entre as músicas e uma actuação estranhamente encurtada. Pelo meio tivemos mais uma lição de thrash metal neste VMF, com os Havok a serem uma das grandes surpresas do evento. «Prepare For Attack», «Point Of No Return» ou «Ingsoc» puseram a frente do palco em alvoroço com o quarteto norte-americano a conquistarem com certeza novos fãs. Meia hora antes do previsto, fruto do set mais curto dos Whitechapel, subiram ao palco os Hammerfall que não esconderam o contentamento pelo regresso ao nosso País e nos presentearam com alguns dos seus clássicos como «Renegade», «Let the Hammer Fall», «Dragon Lies Bleeding» e «Glory To The Brave», para além de um medley instrumental desse seu primeiro álbum, editado há já vinte anos. Se Joacim Cans muitas vezes brincou com a idade dos membros da banda, o Oscar Dronjak evidenciou-se pelas suas guitarras e pelas mudanças de vestimenta. Para terminar tivemos direito a «Hammer High», «Bushido» e a incontornável «Hearts On Fire». Se estivemos de boca aberta a cantar com os Hammerfall assim continuamos com os Gorguts, desta feita sem produzir qualquer som, apenas de queixo caído com o death metal inventivo da banda liderada por Luc Lemay. «From Wisdom to Hate», «Obscura», «Le Toit du Monde» ou «Forgotten» foram alguns dos temas interpretados numa performance envolvente e hipnotizadora. Para terminar este VMF tivemos os Cough que nos trouxeram os ares de Moledo a Vagos com o seu doom/stoner, ilustrado por curiosas projeções.
Se a dúvida persistia, o Vagos Metal Fest comprovou aquilo que muito se gritou durante esse fim-de-semana no recinto: “Vagos é aqui, car*#$o!”. [CG]